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Algumas opiniões

Existe machismo na infância?

Que o machismo está presente na nossa sociedade é um fato evidente para todos. Nem mesmo os principais reprodutores, as grandes mídias, escondem a presença constante do machismo expressas, muitas vezes, na violência física.  

De uma forma ou de outra somos todos influenciados por essa cultura e fazemos sua reprodução. Isso significa que homens são machistas e mulheres reproduzem o machismo. Mas e as crianças? Sim, elas também embarcam nesse mundo tão opressor!

Antes que você já comece a discordar de um texto nem lido, calma, explicarei esse ponto de vista. 

Então, comecemos pelo princípio. Em qual momento nos tornamos machistas?

Ninguém nasce machista! O bebê, seja menino ou menina, começa sua vida com as mesmas necessidades. Todas e todos precisam ser amamentados, cuidados, necessitam de carinho, compreensão, conversas e brincadeiras. Essa última parte deixaremos para uma nova postagem. Então qual a diferença de um bebê menino para uma bebê menina. Vamos imaginar aquele pequeno ser, de um, dois ou três meses. Como deveria ser difícil distinguir seu sexo se visto apenas de fraldinha. Mas vistos vestidinhos facilmente um desconhecido se aproxima e pergunta qual o nome dela ou qual o nome dele com muita certeza de seu sexo sem ao menos nenhuma diferença física aparente.

Não somos adivinhos, simplesmente estamos habituados a perceber o sexo de um ser pelas cores, roupas e mais tarde pelo comportamento. Os responsáveis pela criança provavelmente esperaram a descoberta do sexo para comprar os utensílios do quarto. Também devem ter começado a comprar as roupinhas facilmente identificadas nas lojas como meninos e meninas. As roupas das meninas, claro, com muitas tonalidades em rosa, flores, princesas e tudo que demonstre delicadeza de uma dama. Para os meninos o azul, amarelo e verde. Na verdade qualquer cor desde que não se aproxime da feminilidade da cor rosa. Os desenhos de heróis, animais mais selvagens como leão, urso, e afins. Nós separamos nossos filhos por cores e personagens bem antes deles nascerem. 

Com o passar do tempo, não muito distante, vamos acrescentando mais distinções. Logo chegam as separações dos brinquedos. Os meninos ganham as primeiras bolas e carrinhos e as meninas, bem, as meninas ganham bonecas e todos utensílios domésticos. As lojas estão preparadas para auxiliarem dentro dessa lógica. Os brinquedos são separados por setores sexistas e somos direcionados para o setor com a simples pergunta: - Para menino ou menina?

Antes de avançar nas etapas é importante uma pausa para uma breve reflexão:  Para que servem as cores e brinquedos na primeira infância?  Figuras coloridas contribuem para o aprimoramento da capacidade motora e cognitiva, raciocínio, fala, audição, entre outras funções. Já os brinquedos devem ser auxiliares no processo de criação, estímulo e imaginação. Qualquer objeto pode virar um brinquedo. Brinquedo é diferente de brincadeira! Mas isso fica para um próximo assunto.

Com a chegada do primeiro aniversário todas as separações se intensificam. Os presentes dos meninos e os presentes das meninas. E assim as casas vão se identificando cada vez mais com “aqui mora uma princesinha ou aqui mora um herói”.

Assim, os meninos vão desenvolvendo suas habilidades motoras, jogando bola, correndo, e “gastando muita energia”, como todos adoram falar.

Já as meninas começam a desenvolver uma fala mais aprimorada com brincadeiras, principalmente de casinha. Ora, meninas falam primeiro que meninos? Meninos tem maiores habilidades com esportes? Por que será? A essa altura do texto é perceptível o quanto estimulamos de forma diferente os meninos e as meninas.

 

Quando nossas crianças vão crescendo todos esses estímulos vão se intensificando, as vezes de forma sútil outras mais “diretas”. O que esperamos de um comportamento feminino e masculino. Meninas devem falar baixo, estar bem limpinha, dançar, ser graciosa. Uma princesinha. Já os meninos, esses queremos um atleta. Podem ser bagunceiros, podem correr, se sujar, fazer amigos. Só não pode demonstrar nenhuma delicadeza.  Tudo isso será fortalecido pelas escolas, na ampla maioria, e sociedade que convive com essa criança.

As crianças funcionam como um espelho, ou seja, refletem tudo o que veem. Elas observam atentamente o que falamos, como falamos, como andamos, como comemos, dançamos, enfim, elas imitam nossas ações. Inicialmente imitam as ações dos responsáveis, depois das professoras, dos colegas, e assim vai.

Então, quando nossas crianças começam a reproduzir o machismo? É fácil, a partir do momento que ela começar a imitar essa ação que lhe foi apresentada.

Já vi crianças que logo que iniciaram a fala, muito pequenas, já falavam que eram princesas e assim se portavam (dentro dos padrões que estão associados a ser uma princesa). Meninos muito pequenos que falavam que não gostavam de bonecas ou de uma roupa rosa, pelo simples fato de ser boneca e rosa.

 

Precisamos parar de tratar os absurdos como naturais. Não é natural! Criança é criança! Não existe brincadeira para menino ou para menina. Bonecas auxiliam na produção da linguagem, sociabilidade, cuidado, percepção do corpo, entre outras. Brincar de bola é essencial para o desenvolvimento da coordenação motora, sociabilidade, regras, entre tantas outras atividades possíveis.

 

Mas se você fez tudo isso e tem um menino que não aceitaria colocar uma blusa rosa ou uma menina que já é oprimida, não se culpe. Somos criados para sermos assim.

Eu tentei a todo custo não adotar essas regras na minha casa. Meu primeiro presente para meu menino foi uma boneca que era minha. Ele cresceu com ela. Hoje se tornou boneco, e adoramos brincar de casinha com ela e com os utensílios de cozinha. Também adora carrinhos, bonecos, bola, massinha, jogos. Mesmo com isso, e mais várias reflexões que fazia e faço durante o seu crescimento, a sociedade (de conjunto) não permite que avancemos para uma sociedade sem opressões e especificamente sem machismo.

Quando meu filho vinha da escola sempre era uma batalha para descontruir algo machista dito por alguma criança e/ou professora. Lembro de uma menina que ela adorava que não permitia que os meninos entrassem na casinha. Ele ficava abatido com isso e sempre o incentivava para que conversasse com ela. A solução dada pelos outros amigos foi: meninas não brincam no escorregador.

Outro fato que tivemos que passar foram as atividades extras na escola. Tinha balé e capoeira no mesmo horário. Meninas no balé e meninos na capoeira. Incentivei e ele fez uma aula experimental das duas. Escolheu, logicamente, a capoeira. Os familiares e amigos adultos reproduzem comentários opressores em diversas situações, como quantas namoradas você já tem? Ou menino não chora! Normalmente não preciso interferir, pois ele já apreendeu a argumentar a responde: Criança não namora e todo mundo chora!

Enfim, não podemos criar nossos filhos dentro de uma bolha. Não permitir que convivam com outros familiares, crianças ou em um ambiente que não pensa o combate a opressão como eu penso, não é a solução. Mudar o nosso comportamento em relação as questões tratadas são fundamentais, mas não suficientes. Precisamos alterar toda estrutura dita natural. Mulheres não precisam de heróis e homens não precisam carregar o fardo de serem heróis. Mulheres não são frágeis. Homens não são necessariamente fortes.

Hoje, mais tranquila, mas não menos preocupada, entendo que trabalhar para combater o machismo é uma luta paralela com todas discussões na sociedade e também na construção cotidiana dentro de minha casa e com as crianças que trabalho.

O resultado é visível. Não criar dentro de uma bolha, mas uma criança capaz de questionar as falas machistas e opressoras de qualquer pessoa. Lembre-se, todos opressores um dia foram crianças. Temos um papel a cumprir.

 

Por tudo isso, e mais um mundo de concepções é que trabalhamos com uma recreação sustentável em todos os níveis, com novas formas de relação com a natureza. Esse momento tão importante para a criança e família que é a festa de aniversário, deve ficar na lembrança como um momento que não comporta nem um tipo de opressão. Alegria, diversão, respeito. Brincadeira meninos de um lado e meninas de outro não são construtivas para um pensamento humanitário sem opressões, ou histórias e teatros tradicionais que reproduzem a força e disputa. Não! Nossa construção de um mundo justo e socialmente igualitário começa por crianças sendo crianças, sem opressão e opressores.  

Crianças precisam de tempo

 

O que me incentivou a escrever esse texto foi uma frase corriqueira em todos os textos que leio sobre educação – Crianças precisam de tempo com os pais. Quando leio essa frase de forma solta concordo com ela. Mas logo vem o contexto. O último texto que li, antes de começar a escrever, dava dicas para uma mãe que trabalha fora de casa de como arrumar tempo para seu filho. Falava como ela poderia transformar todos os afazeres doméstico em uma grande brincadeira e se desdobrar para deixar seu filho feliz. Um último parágrafo falava que o pai tem uma grande importância na participação da educação dos filhos e que deveria reservar 20 minutos para ajudar nas lições de casa.

 

Não é piada! Existem textos assim, e não são poucos.

 

Não sou adepta a textos conselheiros sobre criação. Acredito que educar uma criança tem a ver com uma concepção de vida que queremos transmitir para aquele ser. Por isso, conselhos i de como acalmar sem bater, como ser firme com a criança, como enfrentar as birras, etc etc, são pouco produtivos se forem tratados de forma isolada.

Pior do que conselhos desse tipo são os métodos infalíveis, mas que sempre falham, de truques para dormir cedo, comer legumes, etc, são as dicas que não dependem de nossa capacidade e vontade. Colocar a responsabilidade por ter tempo para os filhos em cima das mulheres é mais uma crueldade do mundo contemporâneo.

Vejamos: Nenhuma mulher acorda cedo para arrumar o filho para escola correndo porque quer. Nenhuma mulher deixa o filho 10, 11 ou 12 horas na escola porque quer. Nenhuma mulher chega cansada, depois de trabalhar o dia todo porque quer. E ainda, nenhuma mulher fica a noite limpando, arrumando e fazendo comida porque quer. Desculpe a generalização, mas nesse caso é necessária.

 

A ocupação das mulheres no mercado de trabalho é um avanço considerável, mas se analisarmos um pouco mais a fundo veremos que é vantajoso para nosso empregador ter uma mulher com menor salário do que um homem que ganhará mais. Sim, ele recebe uma recompensa salarial por ter nascido com um adereço que não temos.

É inegável que as mulheres trabalham mais que os homens, pois a entrada no mercado de trabalho formal não nos tira a responsabilidade de trabalhar em casa. Necessário enfatizar, os trabalhos domésticos são um trabalho.

A responsabilidade pela criação dos filhos ainda pertence as mulheres. Ou seja, nós trabalhamos fora, trabalhamos em casa e temos um outro ser para criar, educar, amar, brincar e suprir todas as suas necessidades. Aff! Não somos heroínas, somos muito exploradas!

 

Esse texto é um grande abraço em você que se culpa diariamente por não ter o tempo que queria para seu filho. A culpa não é sua!

 

A responsabilidade pela criação das crianças não pode ser apenas das famílias, é também do estado. O estado é o responsável por garantir educação, saúde, segurança, lazer. Nada disso é garantido de forma eficaz. Esses temas ainda são discutidos de forma corriqueira por todos nós. É palpável perceber as falhas governamentais nessas áreas quando precisamos de médicos, escola, pracinha, etc etc e não temos. É perceptível o problema quando saímos correndo a noite para não sermos assaltadas (esse seria o menor perigo para nos mulheres). Todos esses assuntos arriscarei tratar em textos mais profundos. Mas o assunto agora é o tempo. E quem garante que nossas crianças tenham tempo? Quem é o responsável por roubar o tempo de infância de nossas crianças? O tempo virou precioso também para elas.

Nossas crianças não têm tempo para tomar um café da manhã tranquilas. Não têm tempo para ler um livro sem interrupções. Não têm tempo de brincar. Nossas crianças não têm tempo para ficarem “atiradas”. Não têm tempo para serem apenas crianças! Quem está roubado o tempo de nossas crianças serem apenas crianças? O estado e governos não roubam apenas nossos dinheiros, respeito, sonhos (e isso já é muito), mas rouba uma coisa preciosa e que nunca mais será recuperada, o tempo da infância. Quando? Como? 

 

O tempo não é palpável. Não vemos o tempo passar. Nos acostumamos e acostumamos nossos filhos a estarmos sempre sem tempo. É corriqueiro vermos uma mãe na rua andando rápido e o filho(a) correndo ao lado. Estamos sempre atrasados. Mais corriqueiro porém é olharmos para nossos filhos e falarmos: Como passa rápido! Será mesmo que a infância passa rápido? Ou será que eles vão crescendo e não vamos nem ao menos ter a chance de perceber.

 

Não quero ser dramática. Sei que vocês devem acompanhar ao máximo tudo em seu filho. O primeiro andar, primeiras palavras, primeira apresentação nisso ou naquilo. Mas vamos um pouco mais a fundo... Quando estamos com nossos filhos também estamos com a cabeça no trabalho, na arrumação da casa, no cansaço, no filme que queremos ver e não vemos porque iremos dormir nos primeiros 5 minutos, etc etc. Não somos capazes de acompanhar seu crescimento e amadurecimento como gostaríamos. Você não está sozinha! Todas nós, meras mortais trabalhadoras, também passamos por isso!

 

O que fazer diante disso? Poderia dar mil e uma dicas de como você se acabar um pouco mais de cansaço e frustração, não farei. Direi apenas, seja verdadeira com sua criança. Não minta, diga que trabalha muito e que precisa disso para colocar na mesa o pão de cada dia. Crie uma criança que pensa e seja capaz de refletir sua tristeza. Crie uma criança capaz de crescer sabendo que precisa estar ao seu lado lutando por um mundo diferente, onde as pessoas sejam mais valorizadas que as máquinas, obras, roupas, dinheiro.

Nossa! Falei que não daria dicas que fossem causar um desgaste e ao final proponho uma tarefa tão grande. Isso mesmo! Não estou propondo dicas momentâneas. Estou propondo uma concepção de educação, de vida! A única talvez possível para alterar essa realidade e assim, espero, nossos filhos deem tempo para seus filhos e tenham tempo para eles mesmos!  

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